domingo, 23 de janeiro de 2011

Há-de flutuar uma cidade



há-de flutuar uma cidade
no crepúsculo da vida
pensava eu... como seriam felizes as mulheres
à beira mar debruçadas para a luz caiada
remendando o pano das velas espiando o mar
e a longitude do amor embarcado

por vezes
uma gaivota pousava nas águas
outras era o sol que cegava
e um dardo de sangue alastrava pelo linho da noite
os dias lentíssimos... sem ninguém

e nunca me disseram o nome daquele oceano
esperei sentada à porta... dantes escrevia cartas
punha-me a olhar a risca de mar ao fundo da rua
assim envelheci... acreditando que algum homem ao passar
se espantasse com a minha solidão

(anos mais tarde, recordo agora, cresceu-me uma pérola no coração. mas estou só, muito só, não tenho a quem a deixar.)

um dia houve
que nunca mais avistei cidades crepusculares
e os barcos deixaram de fazer escala à minha porta
inclino-me de novo para o pano deste século
recomeço a bordar ou a dormir
tanto faz
sempre tive dúvidas que alguma vez me visite a felicidade


Al Berto

3 comentários:

Zé Povinho disse...

Algo triste, mas bonito.
Abraço do Zé

João Roque disse...

Eu não posso acreditar! Acertaste no terceiro!!!
Ficaria perplexo se pusesses um poema do quarto preferido (aqui, abro uma excepção e pode ser um de dois: uma mulher ou um homem...)

Graça Pires disse...

Há tanto tempo que aqui não passo, nem sei por que motivo...
Este poema do Al Berto é um dos poemas que eu mais gosto. Foi o primeiro poema que ouvi dito por ele mesmo numa sessão de poesia galega e portuguesa.
Um beijo, amiga.