" Por que razão a sua vida e a sua morte ocupam já um lugar cimeiro no cancioneiro popular e, verdades como são, adquirem o imaginário das lendas?"
Álvaro Cunhal, Público/ Magazine, 4-2-1996
Catarina
Não vou cantá-la
em alfabeto
de retrato
Prefiro imaginá-la
no Baleizão secreto
de um poema abstracto.
Correndo para a bala
no destino concreto
do seu acto.
Manuel Alegre; in Alentejo e Ninguém; 1996
Chamava-se Catarina
O Alentejo a viu nascer
Serranas viram em vida
Baleizão a viu morrer
Ceifeiras na manhã fria
Flores na campa lhe vão pôr
Ficou vermelha a campina
Do sangue que então brotou
Acalma o furor campina
Que o teu pranto não findou
Quem viu morrer Catarina
Não perdoa a quem a matou
Aquela pomba tão branca
Todos a querem p'ra si
Ó Alentejo queimado
Ninguém se lembra de ti
Aquela andorinha negra
Bate as asas p'ra voar
Ó Alentejo esquecido
Inda um dia hás-de cantar.
Zeca Afonso
O Alentejo a viu nascer
Serranas viram em vida
Baleizão a viu morrer
Ceifeiras na manhã fria
Flores na campa lhe vão pôr
Ficou vermelha a campina
Do sangue que então brotou
Acalma o furor campina
Que o teu pranto não findou
Quem viu morrer Catarina
Não perdoa a quem a matou
Aquela pomba tão branca
Todos a querem p'ra si
Ó Alentejo queimado
Ninguém se lembra de ti
Aquela andorinha negra
Bate as asas p'ra voar
Ó Alentejo esquecido
Inda um dia hás-de cantar.
Zeca Afonso
Catarina Eufémia Baleizão, filha de José Diogo Baleizão e de Maria Eufémia, nasceu na aldeia de Baleizão, no Monte do Olival, concelho e distrito de Beja, em 13 de Fevereiro de 1928 e teria feito oitenta anos este ano se não tivesse sido assassinada em 19 de Maio de 1954 e a saúde lho tivesse permitido concluir as oito décadas de vida. Era uma assalariada rural, pobre e analfabeta, como muitas outras alentejanas e tal como elas casou cedo, em 1946, e , muito nova , teve três filhos. A sua vida teria sido anónima e esquecida como a de tantos outros alentejanos de pobre condição se não tivesse acabado em circunstâncias tão trágicas, guindando-a a símbolo da resistência e contestação ao regime salazarista. No Alentejo , região de latifúndios e de emprego sazonal, as condições de vida dos camponeses, sem terras e assalariados, eram extremamente difíceis. Esta situação sócio-económica e laboral, penosa e dura, agitou as massas camponesas da região a partir de meados dos anos 40, tendo-se agudizado nas duas décadas seguintes. Eram inúmeros os tumultos e mais frequentes ainda as greves rurais, que acabavam sempre com a intervenção da GNR e devidamente vigiadas pela PIDE, que capturava muitos dos intervenientes. Numa dessas greves de trabalhadores agrícolas, ocorrida em 19 de Maio de 1954 na aldeia de Baleizão, um grupo de camponeses dirigiu-se à residência do patrão e entre eles estava Catarina Eufémia, grávida e com um filho de oito meses ao colo. Entre outras pretensões, reivindicava-se para as mulheres um aumento da jorna (salário de um dia de trabalho) de 16 para 23 escudos, na campanha da ceifa. No entanto, a GNR apareceu, como tantas outras vezes o fizera, acabando por intervir duramente. Para além dos tiros para o ar, de intimidação e para dispersar a concentração de camponeses, outros houve que tiveram um destino mais cruel e sangrento. De facto, o tenente Carrajola, da GNR, no caminho do grupo de assalariados para a casa do patrão, matou Catarina Eufémia com vários tiros, que caiu com o filho ao colo. Este assassinato a sangue-frio foi uma das mais brutais acções do regime de Salazar, causando uma revolta surda e contida entre as massas rurais alentejanas. Catarina tornou-se, depois da sua morte trágica, como um símbolo de resistência ao fascismo, como um modelo de mulher. Muitas vezes se lhe jurou vingança, tal foi a raiva de dor que pulsou durante décadas no Alentejo pela sua morte estúpida e cruel. Os cantores de intervenção e os poetas opositores ao regime não deixaram de cantar a resistente camponesa assassinada: José Afonso, Sophia de Mello Breyner ou José Carlos Ary dos Santos, entre outros. ( Adaptado do Google)
45 comentários:
Lutava por pão e trabalho e, rapidamente, tornou-se um símbolo da resistência do proletariado rural alentejano à repressão e à exploração do salazarismo e, ao mesmo tempo, um símbolo do combate pela liberdade e da emancipação da mulher portuguesa.
Nos tempos que correm, o exemplo de Catarina Eufémia continua a inspirar homens e mulheres que lutam, ainda, pelo fim da exploração, por uma sociedade mais justa e fraterna.
Sempre em Luta! Kiss
Ludo, Migo!
Lutava por pão e trabalho. E tão injustamente caíram dois por terra. Ela e o filho que carregava nas entranhas.
Não esqueçamos esta ditadura sangrenta que explorou, maltratou e matou os seus filhos.
Beijinhos grandes
Uma mulher notável...
Doce beijo
Profeta
Só posso concordar. Como deduzes da leitura.
Obrigada!
Beijos
Um hino genial e marecido amplamente a uma lutadora pelo seu povo que amava.
Uma descrição narrada com o seu geito peculiar de ser/sentir doces.
Ela agradecer-lhe-ia como agradece de certeza lá no céu azul lindo.
Uma verdadeira defensora da liberdade que possuimos hoje.
Excelente pelo conteúdo e pela expressão terna e repleta de justiça contra a afronta, dignidade e passado anti-fascista de alguém humilde, mas com um coração terno, pensador e livre.
Excelente! Adorei!
Beijinhos de amizade.
Sempre a estimá-la e a respeitá-la pela sua imensa significação de beleza e pureza de valores e princípios que defende e expressa
pena
Onde estás Isabel? Onde estão as tuas palavras ternas, meigas e carinhosas? Temos saudades tuas...obrigada por teres lembrado...beijo querida...
Uma mulher do povo, e com a força do povo para lutar por aquilo que precisava para viver. Trabalho e pão. Um exemplo a ser seguido por muitos na clandestinidade dos tempos de então.
Um abraço
Olá, Isabel!
Trouxeste-nos hoje uma mlher que foi imortalizada pela canção do Zeca.
Tornou-se num marco da resistência das mulheres sofridas e exploradas do Alentejo, essa região linda e serena, mesmo na adversidade.
Quando há uns dois anos me desloquei propositadamente aBaleizão para ver com estava aterra de catarina Eufémia, só o nome da terra na velha estação de combóio já me tocou.
depois, lá no centro, uns velhotes simpáticos conversavam á volta da estátua da Catarina. Foi um momento que passei em comunhão com o Alentejo profundo e com memórias tão sofridas como agradáveis.
Um abraço para ti.
Homenagem merecida a alguém que pela sua luta se imortalizou.
Um beijo para ti que a lembraste.
AMIGA
EU AMANHÃ VENHO LER ESTA HOMENAGEM - OU OUVIR, COMO SABES - QUE NÃO QUERO PERDER À GRANDE CATARINA.
ENTRETANTO HÁ UMA AUSÊNCIA DE VÁRIOS DIAS DA AMIGA "GASOLINA" DA ÁRVORE DAS PALAVRAS, NAO SEI SE SABES ALGO DELA.
BOM DESCANSO PARA TI E BEIJINHOS.
AH!
NÃO TE ASSUSTES COM A FOTO!
ANDEI NUM TRICICLO À VELOCIDADE DA LUZ E REJUVENESCI UM POUCO... FIQUEI SÓ UM CADINHO MAIS VELHA QUE A TUA MARIA!
BEIJINHOS PA ELA TAMBÉM!
Trança de trigo roxo Catarina
morrendo alpendurada
do alto de uma foice.
Soror Saudade Viva assassinada
pelas balas do sol
na culatra da noite.
Retrato de Catarina Eufémia
Ary dos Santos
Catarina Eufémia!
Obrigada por recordares!
beijos
ficou como um simbolo da repressão salazarista, que não poupava mulheres e crianças...
abraço Sophiamar
(luis eme)
Manuel Alegre também lhe dedicou um poema, no livro Alentejo e ninguém. Não o tenho aqui, mas vou procurar... beijos!
Pena, colega, amigo!
As suas palavras, prolíferas em elogios que me deixam quase sem jeito, são, apesar disso, sempre bem vindas pois que são escritas por alguém que, em minha opinião, conquistou um lugar de prestígio, de muito respeito e dignidade na blogosfera.
Catarina Eufémia foi uma defensora da Liberdade , tolhida nos seus intentos por uma ditadura cega e criminosa. Prestemos-lhe a devida homenagem.
Sempre muito grata, desejo-lhe um bom feriado.
Beijinhos
Amigona
Continuo a pessoa disponível, de palavras meigas,sincera, que sempre fui. Penso eu. Os valores que me ensinaram são os valores que continuam a mover-me e que aqui me têm mantido.
Aqui estou ao dispor de quem me quer bem, de quem em mim acredita, de quem me trata com sinceridade, honestidade, amizade.
Beijinhos sinceros
A MORTE DE CATARINA FOI UM DOS MAIS HEDIONDOS CRIMES DO ESTADO NOVO, MOSTRANDO A COBARDIA DOS SEUS ACÓLITOS AO DISPARAREM SOBRE UMA MULHER DESARMADA, SEM QUALQUER DEFESA E PARA MAIS GRÁVIDA. ASSIM UMA BALA DECEPOU DUAS VIDAS UMA AINDA TÃO JOVEM, OUTRA AINDA POR VIR À LUZ DO MUNDO.
QUE TERÁ SIDO FEITO DOS OUTROS 2 FILHOS DE CATARINA, ENTRETANTO? E DA SUA RESTANTE FAMÍLIA? SUPONHO QUE À DATA DO CRIME SEUS PAIS E MARIDO ERAM VIVOS. SEUS PAIS FATALMENTE JÁ O NÃO SERÃO, MAS SEU MARIDO E FILHOS PODEM ESTAR VIVOS AINDA. NATURALMENTE SEGUIRAM A SUA TRISTE VIDA DE ÓRFÃOS DE MÃE MAS LÁ TERÃO CONSEGUIDO CONSTRUIR AS SUAS PRÓPRIAS FAMÍLIAS.
BELA E SENTIDA ESTA GRANDE HOMENAGEM, ENTRE POESIA E BIOGRAFIA, QUE LHE DEDICAS, AMIGA!
UM BOM FERIADO
BEIJINHOS SEMPRE AMIGOS
Elvira
Uma mulher que pagou bem cara a luta em que se envolveu. E afinal apenas queria pão.
Não esqueçamos os horrores em que a ditadura foi prolífera.
Beijinhos
Jorge
Uma mulher imortalizada pelos nossos melhores poetas.
Também lá fui algumas vezes. A última delas, tinha como objectivo visitar Villanueva del Fresno, onde o General Humberto Delgado foi assassinado mas detive-me mais de uma hora no largo onde está a estátua da Catarina. E comovo-me sempre. Aquela gente aprendeu a viver lado a lado com o sofrimento e a dor. Tão afáveis, tão destituídos de sentimentos maninhos como o ódio e a vingança. E os seus cantares dolentes são uma das minhas paixões.
Um beijinho
Ana
Obrigada, amiga, pelas palavras sempre doces.
Um beijinho
Bem hajas!
Aspásia, Amiga!
Não sei nada da Gasolina. Tens o mail dela? Eu tive-o em tempos mas se precisares irei tentar descobri-lo.
Terá ido de férias?
Volta quando puderes.
Beijinhossssss muitosssss
Aspásia, Miga como fizeste essa viagem em tão pouco tempo? Foste no foguetão do sineiro? Tem cuidado! Aquelas três bombas não auguram nada de bom.
Tenho algumas fotografias tão parecidas! Que linda menina!
Beijocas!
anamarta
Obrigada, amiga, pela transcrição do poema de Ary dos Santos. Um contributo precioso.
Beijinhos
Bem hajas!
Luís
Um regime que não podemos esquecer para que não se repita.
Matou Catarina e o filho que dentro de si levava.
Tanta crueldade!
Beijinhos
huckleberry friend
Já encontrei o livro e o poema.Obrigada por mo relembrares.
Beijinhos
Vai aparecendo!
Amiga, passei por aqui. Deixo-lhe os votos de bom feriado, e um abraço
Belíssima homenagem.
Das mais bonitas que vi pelos blogues.
Foi das primeiras histórias que a minha mãe alentejana me contou.
Muitos beijinhos e veludinhos azuis
PS: Desculpa ter estado uns dias sem vir aqui, mas o burro do meu blogroll dizia que não tinhas posts novos.
Modernices:)))
O MEU ABRAÇO, ISABEL.
jJorge Guedes
Olá Sophiamar
Outra grande figura! Esta pedia pão e deram-lhe a morte.
Para que não se esqueça do que se alimentava o regime salazarista: do sofrimento dos que pediam melhores condições de vida e do sangue com que os calavam.
Obrigada pelas palavras que recordas sobre Catarina!
bjs
Esperança
Muito belo, este post.
Olha, acabo de colocar no blog, os endereços de todos quantos postaram poemas meus.
O meu obrigado.
Beijinho
Elvira,Amiga!
Desejo-lhe também um bom feriado. Tirei uns diazitos para descanso.
Beijinhos
Bluevelvet
Não tens que pedir desculpa, amiga.
Vem quando puderes, quando te apetecer.
Serás sempre bem vinda.
Também não tenho sido assídua no teu blog.
Beijinhos
Jorge:
Um abraço para ti também. Com carinho. Tem um bom feriado!
Escriba Esperança
Afinal somos vizinhas! Podemos até conhecer-nos. Quem sabe!
Gostei muito das palavras que aqui deixaste e veio-me à memória o Zeca, nos Vampiros.
Beijinhos
Bom feriado!
Vieira Calado
Muito obrigada pela referência ao meu blogue. Foi com muito gosto que te referi, conterrâneo.
Vou passar por lá. Desculpa a minha falta de assiduidade.
Beijinhos
Passei aqui para te desejar bom feriado e para te alertar que, o preço dos combustíveis continua a subir. Para o Movimento de Utentes dos Serviços Públicos (MUSP) estes aumentos, decretados pelas empresas petrolíferas para aumentarem os seus fabulosos lucros, são feitos sem razões que o justifiquem.
Neste sentido, o MUSP exorta as populações a exigirem, através de acções e iniciativas de protesto e reivindicação, que o Governo assuma as suas responsabilidades, tomando as medidas que se impõem para que os aumentos parem
Divulga e Age!
Não deixes que te roubem mais…
Combustíveis Alternativos Já!
----
Kiss
Não há post novo mas há novo abraço.
Bom feriado!
Jorge P.G.
Ludo, Migo!
Não posso estar mais de acordo contigo. A subida desenfreada dos combustíveis, agora quase diariamente, tem de ser travada por todos nós.
Tomemos medidas!
Beijinhos
Jorge, Amigo!
Não havia post novo. Mas há agora. Estava prontinho.O próximo sairá no domingo. Um texto meu.
Um abraço e...um beijinho.
Bom feriado.
Bem hajas!
porque catarina foi catarina,
por ela solto o grito da liberdade
que tanta gente já não entende e
deturpa dia após dia!
sabes, isabel,
isto de ser democrata, desde que "eu" mande...
isto de querer a liberdade, desde que imponha a "minha" vontade...
isto de ter a maioria, por desprezar os direitos do próximo...
chamem-lhe o que quiserem, mas estamos cheios de gente assim...
nem respeito!
beijinhos grandes
(Já fui para as tuas bandas e voltei agora, não gosto desses sítios...)
Querida Gaivota
Como te compreendo amiga!Hoje, muito melhor do que há dias. Os meus sítios são serranos, genuínos, onde ainda se mantêm abertas as portas das casas, onde se emprestam os ovos, as batatas, o pão que se pagam depois da galinha os pôr, depois da colheita dos tubérculos...
Vais gostar deles.Dos meus sítios. Tenho a certeza.
Um dia, receberei lá os amigos como tu.
Mil beijinhosssssssss
p.s Se puderes manda email contando onde estiveste
beijo.
comovente a tua homenagem...
Amiga Sophiamar
Se calhar até já nos encontrámos nesses caminhos da Educação. Ou nos cruzámos junto à minha Ria Formosa. Quem sabe?
Também me veio à lembrança a canção do Zeca, que por acaso até é a minha preferida.
bjs
Esperança
Herético
Recordar Catarina é sempre comovente. E com ela recordamos muitos mais.
Um beijo para ti também e vai passando por aqui.
És bem vindo!
Bem hajas!
Escriba Esperança
Talvez já nos tenhamos cruzado por aí.
Não me é estranho o teu discurso.
E a tua presença é bem vinda.
Beijinhos
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